O BiodiverCidade é um fórum de discussão criado por docentes do curso de Licenciatura de Ecologia e Paisagismo da ESAViseu onde são debatidas questões de planeamento e desenvolvimento estratégico, em questões relacionadas directa ou indirectamente com o ambiente e a biodiversidade da cidade de Viseu ao nível dos recursos naturais mas também culturais.


sábado, 6 de março de 2010

As TILIAS do Mestre Aquilino Ribeiro e... as nossas


Neste artigo podemos ver a sensibilidade de uns e outros. Vou apenas fazer referência ao Mestre Aquilino Ribeiro ilustrando a sua sensibilidade ecológica e a forma como o autor lê a paisagem através dos cinco sentidos. É um "Malhoa da prosa". Aproveito para fazer referência a um livro a «A Paisagem de terras do Demo» publicado pela Autora Isabel Queiroz. Um testemunho a não perder para os amantes do Mestre.

Na voz de Aquilino Ribeiro in Geografia Sentimental

«…O meu pátio não é grande como o eido das herdades lá para o Sul, onde se improvisam corridas de touros, embora nele possa manobrar à vontade a chula com duas boas dúzias de pares dançantes. Mas é acolhedor, aconchegado e aberto a quem vem. Di-lo à boqueira S. Pedro em mármore de Pero Pinheiro, que ainda não despregou as chaves da ilharga para fechar o quer que seja. As tílias, que o circundam e recobrem de sombras e perfume, plantei-as eu, e ano por ano as fui acalentando e tutelando. Por isso, quando arribo de Lisboa, recebem-me luxuriantes, sonoras das abelhas que lhes chupam o pólen, todas elas voltejantes e doiradas como as estrelas que recamam nos painéis os halos das Virgens. Também não dou licença que lhes apanhem a flor, nem para calmante de nervosos, ainda que o mundo todo se desconjunte com ataques de epilepsia. As flores converter-se-ão no néctar dos meus cortiços e num sobrecéu de pingentes, pérolas baças, maçanetas de castorina, que dão ideia de que se arreiaram para uma festa. Chegam a parecer-me mais tafuis que esposas de marajás. Um ano que as deixei esflorar, partiram um ramo nesta, uma frança naquela, fizeram destroços noutras. Imagino a depressão, para não dizer sofrimento, desta árvore que, sendo casquilha, põe todo o desvelo na toilette. Realmente, se há planta que tenha o senso da simetria e das belas ordenanças, numa palavra, ponha garridice no seu amanho, é esta. Mutiladas, enquanto não escondem o aleijão e não retomam a sua forma, não dormem. São um pouco preciosas, túmidas da frieza de seus climas originários, mas a poder de bem parecidas acabamos por considerá-las quase afáveis. Será pedantaria formular que me conhecem e me aguardam todos os anos, por altura de fins de Julho? Quando chego, o meu primeiro olhar é para a sua ramagem, o especioso. Um olhar que lhes fala: —Bons dias, bons dias! Bonitas! Depois, outro para os fustes: — O que vocês cresceram! Daqui a pouco já as não posso abraçar a expandidos braços. Verdade, mais uns anos e bem de junto as não abraçarei. Receberão os abraços dos meus filhos, ao mesmo tempo que passem por cima delas em bólide ignescente os vindouros dos marantéus que tomei sob a guarda…»

Esta foto já dista no tempo alguns anos, mas serve para ilustrar a nossa sensibilidade para com as árvores. É contudo, com satisfação que posso afirmar que esta mentalidade está a ser alterada na nossa cidade.

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